Uma das principais questões que preocupam o investidor na hora de arrematar um imóvel em leilão judicial, diz respeito à responsabilidade quanto aos débitos de condomínio que recaem sobre o mesmo e que, consequentemente, resultaram na hasta pública.
Assim, é relevante a discussão acerca do tema que, mesmo após a decisão do STJ no sentido de determinar que a responsabilidade pelo pagamento é de quem exerce a posse do imóvel, ainda divide entendimentos no E. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Para fins de esclarecimento da questão, impõe-se observar que o Colendo STJ, quando do julgamento Resp 1.345.331/RS, paradigma do Tema nº 886, fixou a tese de que “o que define a responsabilidade pelo pagamento das obrigações condominiais não é o registro do compromisso de compra e venda, mas a relação jurídica material com o imóvel, representada pela imissão na posse pelo promissário comprador e pela ciência inequívoca do condomínio acerca da transação.”
Em referência ao Tema (nº 886), vale destacar a decisão proferida pela eminente Terceira Vice-Presidente do TJ/RJ, Des. Maria Augusta Vaz Monteiro de Figueiredo, que negou seguimento ao recurso especial nº 0047135-47.2016.8.19.0000, aduzindo que “… ao reconhecer que o executado permaneceu na posse do imóvel arrematado até a data de imissão na posse do arrematante e decidir que os débitos de condomínio vencidos até a referida data deve ser deduzido do produto do leilão, o acórdão recorrido se alinhou ao referido precedente de observância obrigatória.”
Ainda, pelo sistema de precedentes adotado no Código de Processo Civil, a interpretação das teses provenientes do regime de recursos repetitivos deve considerar sua finalidade em prol da uniformização da jurisprudência, de maneira que é inconcebível a distinção se esta não for em razão de fator relevante na motivação do julgado paradigma. Deve prevalecer, portanto, a interpretação teleológica da tese, conforme os ditames da isonomia.
Nessa mesma linha, o ilustre Des. Eduardo Azevedo Paiva, da Col. 18º Câmara Cível do TJ/RJ, também se manifestou precisamente sobre o Tema nº 886, como se vê do aresto ora transcrito:
“Não se desconhece a responsabilidade do arrematante pelo pagamento das despesas condominiais após a expedição da carta de arrematação, documento hábil a efetivar a transferência da propriedade do bem, ainda que não tenha havido a imissão na posse do imóvel objeto da lide. ENTRETANTO, O CONDOMÍNIO SÓ PODERÁ DIRIGIR A COBRANÇA EM FACE DO ARREMATANTE SE TIVER CIÊNCIA DA ALIENAÇÃO E DA IMISSÃO NA POSSE DO IMÓVEL, TAL COMO OCORRE NA PROMESSA DE COMPRA E VENDA NÃO LEVADA A REGISTRO. Esse é o entendimento firmado pela colenda Segunda Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.345.331/RS (Rel. Ministro Luis Felipe Salomão), sob o regime dos recursos repetitivos.”
(0194908-06.2010.8.19.0001 – Des. EDUARDO DE AZEVEDO PAIVA – 18ª Câmara Cível. DJERJ 02/06/2016)
A favor do referido entendimento, os julgados a seguir:
0054886-17.2018.8.19.0000 – AGRAVO DE INSTRUMENTO Des. VALÉRIA DACHEUX NASCIMENTO – Julgamento: 19/06/2019 – DÉCIMA NONA C MARA CÍVEL
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESPESAS DE CONDOMÍNIO AÇÃO DE COBRANÇA. UNIDADE CONDOMINIAL OBJETO DE ARREMATAÇÃO. DECISÃO QUE ATRIBUIU AO ARREMATANTE A RESPONSABILIDADE PELOS DÉBITOS CONDOMINIAIS VENCIDOS APÓS A ARREMATAÇÃO IMPOSSIBILIDADE. POSSE EFETIVA DO IMÓVEL QUE DETERMINA A RESPONSABILIDADE, DE ACORDO COM POSICIONAMENTO DO C. STJ. PERÍODO DE COBRANÇA DE TAIS VALORES QUE É DE RESPONSABILIDADE DE QUEM SE ENCONTRA NA POSSE DA UNIDADE, DE MODO QUE O VALOR OBTIDO COM A ARREMATAÇÃO DO IMÓVEL PODE SALDAR O DÉBITO. VALOR CORRESPONDENTE AO PERÍODO DE 09 MESES QUE DEVE SER SUB-ROGADO NO PREÇO DA ARREMATAÇÃO, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DOS EXECUTADOS. RECURSO PROVIDO.
0047135-47.2016.8.19.0000 – AGRAVO DE INSTRUMENTO Des(a). VALÉRIA DACHEUX NASCIMENTO – Julgamento: 25/07/2017 – DÉCIMA NONA C MARA CÍVEL
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE COBRANÇA. IMÓVEL LEVADO À PRAÇA. DECISÃO DO JUÍZO SINGULAR QUE INDEFERIU O PEDIDO DO ARREMATANTE. REQUERIMENTO DE QUE O PAGAMENTO DAS COTAS CONDOMINIAIS EM ATRASO SEJA REALIZADO COM O VALOR ARREMATADO. DESPESAS CONDOMINIAIS DO PERÍODO ENTRE A ARREMATAÇÃO E A IMISSÃO DOS AGRAVANTES NA POSSE DO IMÓVEL. PERÍODO DE 16 MESES EM QUE O IMÓVEL FOI UTILIZADO PELO EXECUTADO SEM O PAGAMENTO DA COTA CONDOMINIAL. INCONFORMISMO DOS ARREMATANTES. – Assiste razão ao Agravante. -De acordo com a norma do artigo 1.336, inciso I, e § 1º, do Código Civil, é dever do condômino contribuir para as despesas do condomínio na proporção de suas frações ideais. – Sabe-se que a natureza das cotas condominiais é propter rem decorrente da propriedade do imóvel. …restou incontroverso nos autos deste instrumento que durante o período de 16 (dezesseis) meses entre a arrematação do imóvel e a imissão na posse dos Arrematantes, o Agravado 2 – José Carlos Nascimento de Santana -, residiu no imóvel sem honrar os débitos condominiais. CONSIDERANDO QUE O AGRAVANTE RELATA A EXISTÊNCIA DE RECURSOS DISPONÍVEIS PARA O PAGAMENTO DA DÍVIDA COM A PRAÇA REALIZADA, O QUE NÃO É CONTESTADO PELA PARTE AGRAVADA, ENTENDO QUE SE MOSTRA JUSTO E RAZOÁVEL A UTILIZAÇÃO DESTES RECURSOS DEPOSITADOS EM JUÍZO PARA A QUITAÇÃO DAS DESPESAS CONDOMINIAIS VENCIDAS NO PERÍODO QUE ANTECEDEU A IMISSÃO DO ARREMATANTE NA POSSE DO IMÓVEL. – Concluo que a decisão merece reforma. – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
Conclui-se então que a responsabilidade pelo pagamento dos débitos de condomínio em leilões judiciais é de quem estiver na posse do imóvel arrematado, e que o débito deve ser quitado com o produto da arrematação. Isto porque, entender em sentido contrário a esse respeito, ocasionará no enriquecimento ilícito de quem estiver na posse do imóvel.